Aug 30 2008
O negro futuro do direito à cópia
Quando se fala de direitos de autor em Portugal, ou do direito à cópia (copyright) nos países onde é esse o direito instituído, tipicamente atropelam-se aquelas que realmente deveriam ser as partes interessadas: autores, consumidores e a sociedade no geral. Num retrato negro daquele que poderá bem ser o futuro mundial - e em muitos aspectos para lá estamos a caminhar - Gerd Leonhard, um palestrista de renome e defensor da cultura livre - escreveu uma história ficcional, esperemos, sobre aquele que poderá ser o nosso futuro, quanto ao direito à cópia na música, e qual o seu impacto em toda a sociedade. Em particular alerto-vos para terem em mente que, em isto sendo aplicado, tudo aquilo que é hoje passível de ser abrangido pelas leis de direito à cópia, como software, livros e imagens, poderá facilmente sofrer da mesma pena.
Assim, e como felizmente ainda existe cultura livre e o artigo foi coberto por uma licença livre, deixo-vos uma tradução de alguns excertos desse artigo, recomendando a sua leitura no original e na íntegra. Vamos ficar de braços cruzados e esperar que o futuro aconteça?
Música em 2015 - Totalmente Segura, Realmente (tipo… completamente) Rara e Muito Muito Valiosa (outra vez)
Atenção: isto é ficção. Por agora.
1 de Junho, 2015
Os esforços herculeanos dos mais eminentes legítimos proprietários dos direitos musicais e propriedade intelectual, representados pela RIIAFPIAAMP (a englobadora organização de produtores de conteúdos conduzida pelo ex-presidente dos Estados Unidos George ‘Hard Work’ Bush, de quem os conhecidos gritos de batalha “Temos o direito de sermos pagos um pouco melhor, carago” e “Direitos-de-autor-são-algo-pelo-que-vale-a-pena-morrer” se podem encontrar agora em canecas e muppies à beira da estrada) e os seus numerosos aliadados executores da lei, as forças militares e os experts anti-terroristas de topo de todo o mundo venceram finalmente. A música é agora 100% rara outra vez, e a ameaça dos jovens criminosos e dos auto-proclamados “Nativos Digitais” usufruindo da música através da Internet sem restrições foi erradicada.
A Guerra à Partilha foi custosa, sem dúvida biliões de Dólares Americados, Euros, Yens e Rupias foram dispendidos e alguns danos colaterais foram também absorvidos, mas finalmente a batalha foi vencida pelos líderes por direito das corporações industriais globais da música - e a música é, uma vez mais, totalmente e permanentemente segura e sob o exclusivo e inviolável controlo dos detentores de direitos. O direito à cópia é sagrado outra vez - haleluia.
Nenhum dispositivo pode tocar qualquer música a não ser que tenha sido autorizada pela Central Music Device Approval Authority em Londres. Todos os dispositivos de gravação de música são proibidos, ponto final, e licenças especiais são necessárias para poder sequer mencionar a sua existência. Equipas robotizadas de controlo de dispositivos patrulham metropolitanos, clubes, bares e escolas por todo o mundo, à procura de pings RFID de qualquer dispositivo que possa ser usado para roubar. A não ser que um dispositivo esteja devidamente autorizado a tocar música, um utilizador que tente fazê-lo irá obter uma gravação em loop de uma mensagem a alertá-lo para o facto desse dispositivo ser ilegal e que ele deve terminar as suas actividades imediatamente.
Prevericadores recorrentes que não cumpram os avisos poderão sofrer de fortes queimaduras nos dedos, cortesia do novo hardware e software QueimaEssesLadrões que está agora embebido em todos os dispositivos audio, tornando esses criminosos facilmente identificáveis à MP7 global (Music Protection Prevention Prohibition Purposeful Peer Panic Production) que se instalou depois da aprovação da Criminal Music Consumption Act (CMCA) ter sido aprovada em 2011. Hospitais em todo o mundo estão a colaborar em pleno.
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Marcos Marado escreve no PL ao Sábado sobre Direitos Digitais. Podem encontrar mais artigos como este no seu blog pessoal. |
Se algo parecido acontecesse nessa altura, ou até agora, eu não ficaria muito surpreendido.
«One cannot be deeply responsive to the world without being saddened very often.» - Erich Fromm
eu ficaria. significaria que os nossos esforços teriam sido em vão…