Já se falou do termo DRM diversas vezes aqui pelo Programas Livres. Mas o que é isso?
Quando compra um carro, ele é seu. Pode fazer o que quiser com ele: conduzi-lo, abri-lo, desmontá-lo… O que quiser, logo que não cometa com ele nenhuma ilegalidade. Quando compra um copo, ele é seu: pode usá-lo quantas vezes quiser, dá-lo, parti-lo, usá-lo para beber ou para fazer dele uma escultura. O que quiser - é seu. Mas… o que acontece quando compra, por exemplo, um CD?
Felizmente a sigla DRM já não é totalmente desconhecida do consumidor, mas, ainda assim, ele tipicamente não sabe a que se refere. DRM é uma sigla, significando formalmente, Digital Rights Management, mas, mais apropriadamente, Digital Restrictions Management, ou, em Português Gestão Digital de Restrições. Termos como protecção contra cópia normalmente referem-se a estas tecnologias. O DRM é uma espécie de “método anti-roubo” como aqueles que existem em algumas lojas, em que um alarme dispara se saires da loja com algo sem pagar. Mas será apenas isso?
Como o seu nome indica, a gestão de direitos digitais aplica-se somente aos meios digitais. O conteúdo digital tem ganho popularidade sobre o conteúdo analógico por dois motivos: o primeiro deve-se ao facto das vantagens técnicas associadas com a sua produção, reprodução e manipulação e o segundo porque, na maioria das vezes, a qualidade é superior em relação ao analógico. Desde o nascimento dos computadores pessoais, os arquivos de conteúdo digital tornaram-se um meio fácil de fazer cópias de modo ilimitado sem aparecer qualquer perda na qualidade das cópias subsequentes. Muito conteúdo analógico perde qualidade com cada geração copiada e frequentemente durante o seu uso normal. A popularidade da Internet e das ferramentas para partilhar arquivos simplificou a distribuição de conteúdo digital.
A disponibilidade de múltiplas cópias perfeitas de material sujeito a direitos de autor foi entendida pela indústria como um golpe ao seu modelo de negócio, em especial dentro da indústria fonográfica, cinematográfica e dos jogos electrónicos. Aqueles que publicam material digital têm modelos de negócio que recaem na habilidade de obter lucro por cada cópia feita do trabalho digital, e algumas vezes por cada execução daquele material. O DRM foi criado e planeado por essas empresas e indivíduos, ainda oferecendo o conteúdo digital, mas com medidas para permitir o controle da duplicação e disseminação do seu conteúdo.
O DRM não protege Autores nem Consumidores - apenas a Indústria.
Mas qual é o problema com o DRM?
As grandes corporações descrevem as tecnologias DRM como tecnologias de “Gestão de Direitos”, mas, na realidade, estas tecnologias fazem gestão de restrições.
Pegando na analogia anterior, a dos alarmes nas portas das lojas, e como ainda é possível “roubar” músicas e filmes depois de os ter comprado, os alarmes terão de ser colocados na porta de entrada da sua casa. E na sua porta das traseiras. E na porta da garagem. E na do arrumo. E em cada uma das passagens de ar para ventilação. Pode parecer caro instalar todos estes alarmes, mas não se preocupe: é a sua casa e portanto não serão as lojas a pagar por esses alarmes, é você que os vai instalar em sua casa. Vem com o privilégio de ouvir a música ou ver o filme que comprou. Ter de dizer “sim, vou instalar estes alarmes”.
Mas estas tecnologias não fazem apenas soar um alarme quando você tenta roubar algo. Elas tipicamente:
- detectam quem acede a cada obra, quando e sob quais condições, e reportam essa informação ao provedor da obra
- autorizam ou negam da maneira irrefutável o acesso a obra, de acordo com as condições que podem ser alteradas unilateralmente pelo provedor da obra
- quando autorizam o acesso, fazem-no sob condições restritivas que são fixadas unilateralmente pelo provedor da obra, independentemente dos direitos que a lei fornece ao autor ou ao público
As tecnologias DRM podem controlar os consumidores restringindo-lhes o acesso a filmes, música, literatura e software, ou, mais precisamente, todo e qualquer formato de dados digital.
Numa loja, se for apanhado a roubar você pode ser enviado à prisão. No caso do DRM, apenas lhe confiscam aquilo que, segundo os alarmes, tentou roubar. Eles não ouvem a sua explicação, não lhe deixam falar com a gerência da loja. Confiscam o que roubou e deixam-no prosseguir o seu caminho. O problema aqui é que você não sabe o que faz os alarmes disparar. E não pode reclamar se achar que o alarme não devia ter disparado. Não pode dizer “não quero alarmes em minha casa” - a não ser que queira abdicar, sem receber o dinheiro de volta, de aquilo que comprou.
Mas lembre-se: você tem uma escolha. Não comprar produtos com DRM.
Mas… Se o DRM é assim tão mau, porque existe?
O DRM é mau para ambas as pontas da cadeia de valor: o produtor e o consumidor. No entanto o intermediário tem muito a ganhar com isto. Peguemos no exemplo da música: A indústria discográfica quer controlar a distribuição da sua música. Eles querem chegar ao maior número possível de pessoas, mas querem receber dinheiro de cada uma delas. Como isso implica saber como é que usa a música que comprou, eles decidiram que era interessante se pudessem cobrar por cada tipo de uso que dá à sua música: se a quiser ouvir no computador compra de uma forma, se quiser ouvir no seu carro terá de a comprar de outra forma, se ainda a quiser ter no seu leitor de mp3, terá de adquiri-la outra vez. Com a queda das vendas de música, cobrar mais àqueles que pagam por ela ainda se lhes afigurou mais atractivo. Mas a música já não era sua? Não podia fazer com ela o que quisesse? Na realidade não: se compra um CD mas não o consegue copiar, se compra uma música em formato digital mas não a consegue tocar no seu leitor demp3, então ela não é verdadeiramente sua: quando a comprou, foi-lhe forçado, com ela, um conjunto de restrições.
Uma posição comum sobre este tema é “pois, isso realmente não é bom, mas a mim não me afecta, por isso não quero saber”. Mas isso pode sair-lhe gorado: um bom exemplo é o recente caso da Microsoft.
Em 2004 a Microsoft criou uma loja online chamada “MSN Music”, cuja música era vendida com um sistema de DRM chamado PlaysForSure. Em 2006 a Microsoft fechou a loja, e abriu uma outra, chamada Zune Marketplace, com outro sistema de DRM. Aqueles que compraram músicas na primeira loja, têm agora de requisitar licenças para ouvir a música que já compraram: têm direito a cinco licenças, que terão de ser inseridas em cinco instalações do Microsoft Windows. Recentemente a Microsoft anunciou que, a partir de 1 de Setembro, as músicas por eles compradas só tocariam nas instalações de Microsoft Windows onde estão as licenças. Se tivessem de reinstalar o sistema operativo, ou actualizar a sua versão (do Windows XP para o Windows Vista, por exemplo), perderiam a licença, deixando de poder ouvir a música que já compraram. Ah, e se tentassem, mesmo que não conseguissem, “enganar os alarmes”… estariam a cometer uma ilegalidade. Depois de todas as reacções a este anúncio, invariavelmente negativas, a Microsoft voltou atrás: uma boa mostra de como a comunidade online consegue defender-se e pressionar corporações como esta. Mas as notícias não são muito animadoras: eles prometem adiar este prazo de 1 de Setembro para algures em 2011, onde irão decidir de que forma agir. Adiam assim o problema, na esperança que o assunto caia no esquecimento. Mas, para quem comprou música lá, não está à espera que ela “dure mais três anos”: devia ter o direito a poder tê-la, para sempre.
E agora? Volta a comprar produtos com DRM?
Para saber mais sobre este assunto, incluindo como ajudar a combater estes sistemas, dirija-se ao site do DRM-PT.
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